Menino dos Olhos
Às seis horas Bruno estava ao pé do Terraço Itália trajando, como mandava o convite, seu terno esporte fino e se sentindo um pouco miserável. Enquanto o elevador subia rapidamente, ele ficou feliz que seus ouvidos estivessem se tampando para que ele não tivesse que ouvir toda aquela ladainha artificial dos outros membros do partido, que se cumprimentavam medindo forças com apertos de mão.
Quando chegou lá em cima, foi escoltado até o salão em que se encontravam seus supostos aliados. No entanto, evitou qualquer tipo de contato com os outros, pegou uma bebida qualquer passeou em sua frente e foi para fora, admirar a paisagem urbana.
Por mais que já morasse no interior há anos, sabia que era ali que pertencia. Àquela cidade estavam ligadas as suas lembranças mais dolorosas, mas são os sofrimentos que moldam o homem; São Paulo estava moldando aquele jovem. Mas por alguns momentos ele acreditou que era capaz de se sobrepor ao superego, inverteu os papéis e se viu domando a cidade do alto. Porém o vento mudou e fez com que o rapaz deixasse os devaneios que despontavam na zona norte e virasse os olhos para linhas curvas e pensamentos sinuosos surgiram em sua cabeça.
Por alguma razão ele desceu de volta os quarenta e dois andares e desbaratou pelas ruas em direção ao prédio que tanto o perturbava. Entrou pelo portão mais movimentado e se juntou à multidão que ainda levava sua vida rotineira por ali. Bruno sempre fora capaz de passar despercebido e sabia que poucos o reconheceriam domo candidato, se ele quisesse.
Serpenteou sem rumo pelos corredores de lojas sem nem notar o odor forte dos restaurantes, sua mente rodava tentando entender o que o levara até ali, sem conseguir alcançar o ímpeto de seus passos.
Aos poucos se afastou do centro daquela mini-cidade e, quando deu por si, notou que se encontrava no que ele imaginava ser uma das áreas mais abandonadas do prédio. Sentiu alívio por deixar para trás o barulho das pessoas e a penumbra lúgubre o acalmou.
O corredor parecia estar imundo, com paredes emboloradas e papéis espalhados pelo chão. Um sorrisinho de lado apareceu nos lábios de Bruno quando ele olhou para seus pés e viu que pisava em um panfleto com seu rosto irritantemente alegre e os números 1475. Sua maior surpresa, porém, foi ao levantar os olhos e continuar vendo os mesmos algarismos.
Não podia acreditar que de todas as 1160 portas do prédio, parara justamente na frente daquela.
A razão pela qual aquele era seu número se tornara uma tradição de família. Quando seu pai se rebelou contra a família nos tempos de faculdade, foi morar com um colega naquela mesma quitinete no Copan. Sempre contava aos filhos histórias daquela época com saudades e dizia que o número do apartamento era seu número de sorte. Bruno o emprestou para sua candidatura e, até agora, ele tinha sido de grande ajuda.
Enquanto pensava no pai, sem perceber, levantou o punho e bateu na porta. Mal um rosto apareceu ele se sentiu constrangido e quis se justificar: “Me perdoe...eu não queria incomodar. Meu pai morou aí e eu queria...”O velhinho sorriu, compreendeu e convidou o moço a entrar. “Eu não nada que mereça ser roubado.” Ele respondeu ao ponto de interrogação que se formou no rosto do outro. “Além do mais, se você resolver me matar, vai demorar mais do que minha doença. Mas você me parece bem apessoado, venha.”
Bruno nem precisou perguntar mais detalhes sobre a doença, ao olhar com atenção reconheceu seus traços, os mesmos que desfiguram as feições de seu pai há meses naquele hospital. Mesmo com todo o apoio médico ele não tinha uma aparência melhor do que a do homem frágil à sua frente, que não devia ter dinheiro para comprar sequer um analgésico.
O senhor tentou puxar conversa, perguntou como o visitante tinha se tornado político. Bruno contou que fora convidado pelo prefeito a se candidatar e que ele vira aí uma oportunidade de aproximar o país de seu tão aspirado Eldorado. “Mas ninguém achava que eu tinha jeito para coisa. Meu pai brincou, querendo saber como eu faria comícios se, desde o colégio, eu tinha dificuldade de me fazer ouvir na chamada.”
Mais uma vez ele sentiu falta do pai. Sentiu-se confortável naquele lugar, com aquele desconhecido. Fechou os olhos e pensou em outros olhos, simétricos aos seus, também fechados para um teto estranho. Como ele queria poder olhar novamente dentro dos olhos do pai e ver lá os seus próprios, tão iguais.
Ficou semi-adormecido por um longo tempo. Ao abrir os olhos, seu telefone tocou. “O papai acordou!” Seu irmão estava eufórico do outro lado da linha. Bruno também estava feliz, mas se lembrou de seu anfitrião. Seu pai estava salvo graças aos cuidados hospitalares que ele e os irmãos podiam proporcionar. Mas aquele velhinho simpático morreria sem...Bruno pousou os olhos nele e percebeu que suas reflexões não adiantavam mais. Ele já estava morto.
Quando chegou lá em cima, foi escoltado até o salão em que se encontravam seus supostos aliados. No entanto, evitou qualquer tipo de contato com os outros, pegou uma bebida qualquer passeou em sua frente e foi para fora, admirar a paisagem urbana.
Por mais que já morasse no interior há anos, sabia que era ali que pertencia. Àquela cidade estavam ligadas as suas lembranças mais dolorosas, mas são os sofrimentos que moldam o homem; São Paulo estava moldando aquele jovem. Mas por alguns momentos ele acreditou que era capaz de se sobrepor ao superego, inverteu os papéis e se viu domando a cidade do alto. Porém o vento mudou e fez com que o rapaz deixasse os devaneios que despontavam na zona norte e virasse os olhos para linhas curvas e pensamentos sinuosos surgiram em sua cabeça.
Por alguma razão ele desceu de volta os quarenta e dois andares e desbaratou pelas ruas em direção ao prédio que tanto o perturbava. Entrou pelo portão mais movimentado e se juntou à multidão que ainda levava sua vida rotineira por ali. Bruno sempre fora capaz de passar despercebido e sabia que poucos o reconheceriam domo candidato, se ele quisesse.
Serpenteou sem rumo pelos corredores de lojas sem nem notar o odor forte dos restaurantes, sua mente rodava tentando entender o que o levara até ali, sem conseguir alcançar o ímpeto de seus passos.
Aos poucos se afastou do centro daquela mini-cidade e, quando deu por si, notou que se encontrava no que ele imaginava ser uma das áreas mais abandonadas do prédio. Sentiu alívio por deixar para trás o barulho das pessoas e a penumbra lúgubre o acalmou.
O corredor parecia estar imundo, com paredes emboloradas e papéis espalhados pelo chão. Um sorrisinho de lado apareceu nos lábios de Bruno quando ele olhou para seus pés e viu que pisava em um panfleto com seu rosto irritantemente alegre e os números 1475. Sua maior surpresa, porém, foi ao levantar os olhos e continuar vendo os mesmos algarismos.
Não podia acreditar que de todas as 1160 portas do prédio, parara justamente na frente daquela.
A razão pela qual aquele era seu número se tornara uma tradição de família. Quando seu pai se rebelou contra a família nos tempos de faculdade, foi morar com um colega naquela mesma quitinete no Copan. Sempre contava aos filhos histórias daquela época com saudades e dizia que o número do apartamento era seu número de sorte. Bruno o emprestou para sua candidatura e, até agora, ele tinha sido de grande ajuda.
Enquanto pensava no pai, sem perceber, levantou o punho e bateu na porta. Mal um rosto apareceu ele se sentiu constrangido e quis se justificar: “Me perdoe...eu não queria incomodar. Meu pai morou aí e eu queria...”O velhinho sorriu, compreendeu e convidou o moço a entrar. “Eu não nada que mereça ser roubado.” Ele respondeu ao ponto de interrogação que se formou no rosto do outro. “Além do mais, se você resolver me matar, vai demorar mais do que minha doença. Mas você me parece bem apessoado, venha.”
Bruno nem precisou perguntar mais detalhes sobre a doença, ao olhar com atenção reconheceu seus traços, os mesmos que desfiguram as feições de seu pai há meses naquele hospital. Mesmo com todo o apoio médico ele não tinha uma aparência melhor do que a do homem frágil à sua frente, que não devia ter dinheiro para comprar sequer um analgésico.
O senhor tentou puxar conversa, perguntou como o visitante tinha se tornado político. Bruno contou que fora convidado pelo prefeito a se candidatar e que ele vira aí uma oportunidade de aproximar o país de seu tão aspirado Eldorado. “Mas ninguém achava que eu tinha jeito para coisa. Meu pai brincou, querendo saber como eu faria comícios se, desde o colégio, eu tinha dificuldade de me fazer ouvir na chamada.”
Mais uma vez ele sentiu falta do pai. Sentiu-se confortável naquele lugar, com aquele desconhecido. Fechou os olhos e pensou em outros olhos, simétricos aos seus, também fechados para um teto estranho. Como ele queria poder olhar novamente dentro dos olhos do pai e ver lá os seus próprios, tão iguais.
Ficou semi-adormecido por um longo tempo. Ao abrir os olhos, seu telefone tocou. “O papai acordou!” Seu irmão estava eufórico do outro lado da linha. Bruno também estava feliz, mas se lembrou de seu anfitrião. Seu pai estava salvo graças aos cuidados hospitalares que ele e os irmãos podiam proporcionar. Mas aquele velhinho simpático morreria sem...Bruno pousou os olhos nele e percebeu que suas reflexões não adiantavam mais. Ele já estava morto.
11 Comments:
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O Alejandro ficou orgulhoso de você quando leu isso
mas é um texto muito bom, de qualquer forma. Gosto da parte em que ele pisa na própria cara (panfletos)
Muito bom, Camila! Percebe-se que mesmo nas latrinas e nas pilhas de redações para os corretores há textos de valor literário! Muito bom mesmo!
Realmente, de primeira qualidade!
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Cacá, seu texto é muito bom! Excelente! Vc postou um texto... Aleluia irmãos!
p.s. tá escrito bento mas é vento.
O Bruno é do PTB, partido do Roberto Jefferson, afinal, seu número começa com 14!
Muito bom Cacá!
Faço minhas as palavras de Lipão, Muriel, B e Giugiu!
Tem um "Fecho" alí no finalzinho
Belo texto! Mas eu demorei pra perceber que se tratava do Copan (até ser citado o nome do prédio)
Excelente texto mesmo...
O Alejandro deve realmente ficar orgulhoso de ter alunas como você!
(ele é mó legal)
um beijão!
O meu querido PAN (Partido dos Aposentados da Nação) se uniu ao PTB do Roberto Jefferson pra escapar da degola da cláusula de barreira, mas no fim a cláusula foi cancelada pelo Supremo e a gente se ferramos...
Pros caras-de-pau:
PEROBA NELES!
Vote Osmar Lins PEROBA
26999
Vejam meu vídeo de campanha...
Que saudades do meu PAN; o único Pan que vou ver agora é o Pan Rio 2007, os Jogos Pan-americanos do Brasil...
http://www.youtube.com/v/6lpokslCuHk
Pros caras-de-pau:
PEROBA NELES!
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