19 novembro, 2007

Manifesto de uma Agregada - Anexo V

Um dolcíssimo pedaço do paraíso...
(eu ainda vou me lembrar aonde estão a Branca de Neve com os Sete anões e a Bruxa má).





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11 novembro, 2007

Manifesto de uma agregada - Parte VI

Arquitetura da destruição

É incrível assistir ao fenômeno da proliferação de lançamentos imobiliários.
A maioria das famílias suburbanas é composta por pai, mãe e um casal de filhos. A dondoca tem como inspiração ser a futura primeira-dama de Barueri, enquanto o patriarca trabalha em um dos galpões, que prolifera um cheiro de tutti-fruit pelos ares. Os filhos têm como modelo os pais.
São mais de 5000 casas naquele humilde pedaço de paraíso sobre a Terra; a maior parte dos moradores declara-se branca e possui um animal domesticado.
Nada como sair às ruas com seu belo cachorrinho e admirar as maravilhas da arquitetura atual: palacetes ao estilo “Noviça Rebelde”, casas americanas com um toque de “Anos Incríveis” e latifúndios à “Fascio di Combattimento”. Porém, o au concours do condomínio e grande lançamento é uma área elevada reservada para grandes terrenos que abrigam mansões com vista para os campos aveludados de golfe.
Os jardins possuem aparência plástica; faunos e deusas seminuas caminham entre os pássaros que nascem entre primaveras e azaléias.
“Veja Banzé! A Branca-de-neve e os sete anões. Olha! A bruxa má está mais distante, atrás de um arbusto. Está bem, deixe seu presente para ela” .
Os sapos e os cata-ventos quixotescos também convivem em paz com as fontes e alvos pedregulhos.
É como se tudo estivesse sintonizado na Cultura FM.

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04 novembro, 2007

O mundo através dos cacos de vidro

Entre arranha-céus, auto-móveis e cacos-de-vidro, eu o conheci: parecia um monstro, coberto de folhas e cheirando a podridão. A barba era rala e os primeiros fios de cabelo começavam a cair.
Os vidros refletiam o cotidiano urbano; todos eram retratados, menos Thomás com suas roupas largas e velhas. Tanto importava a cor, verde ou vermelho, os faróis não indicavam a direção para esse forasteiro urbano; a fumaça fazia com que se confundisse com a cinza do asfalto.
Sua aparência lembrava-me uma velhinha, de tão corcunda. Não era derrotado pelo tempo, mas pelo peso da realidade previsível e tediosa que carregava em suas costas.
Cruzei com ele apenas duas vezes na Av. Faria Lima, porém em ambas as situações meus pensamentos pareciam descolar de meu corpo. Quer dizer, não sei quantas vezes passei por ele, mas foi semana passada que eu o vi, realmente, pela primeira vez. Thomás - que depois descobri que gostava de ser chamado Bolandeira – estava brincando com pedaços de vidro coloridos em frente a uma agência dos correios, sentado em uma pose de grande ancião. Seu corpo tinha cortes aparentes pelos braços, pescoço e nas faces. Estava tão concentrado que não reparou na minha vigilância.
Poucos dias depois, e agora com coragem, me dirigi ao Bolandeira e puxei assunto. Perdi a noção do tempo, e reparando que ele não tirava os olhos dos pequeninos quadradinhos coloridos, perguntei-lhe sobre sua fixação por aqueles objetos que para mim não tinham valor.
Naquela mesma noite tive um sonho que não me abandonou:
[Estava em um lugar claro, parecia uma rua, tudo estava embaçado. O sol era enorme, por pouco não chegava a encostar nos picos dos prédios. Do outro lado da rua encontrava-se Bolandeira, na mesma posição que da primeira vez. Meus pés me levaram até ele. O sinal estava vermelho para mim e os carros continuavam a sua sintonia desenfreada, mas isso pouco me importava.
Cheguei a ele, e ele me disse: “Os vidros são os verdadeiros olhos, eles me fazem enxergar. O sol cega a gente e nós não vemos nada do que é”. Eu peguei uns vidrinhos verdes que estavam em suas mãos, arranquei meus olhos e coloquei os pedaços transparentes em seu lugar.
Tudo ficou nítido, mas o céu começou a desfragmentar e cair aos poucos]
Eu acordei.
Eu tinha muito de Thomás e isso era insuportável. A partir desde dia fugi, e fujo dele todos os dias.

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